É o que revelam pesquisas recentes. A presença da figura paterna ajuda a afastar problemas como a obesidade e uma série de transtornos psicológicos.
Por André Santoro
Quem nunca presenciou uma cena como a que sugere a da foto abaixo?
Imerso na leitura do jornal, o pai ignora solenemente o filho, que
suplica por alguns momentos de atenção. Frustrada com a rejeição paterna
— que remédio? —, a criança se retira e vai brincar sozinha ou com
algum amiguinho. Se isso acontece uma vez ou outra, nenhum problema.
Agora, caso vire rotina, ela pode levar para a vida adulta uma série de
transtornos psicológicos.
A curtíssimo prazo, ou seja, ainda na infância, esse distanciamento
acaba até mesmo afetando a saúde do pequeno enjeitado. Vamos abrir mão
de preconceitos: as mães também podem assumir essa postura de pouco
caso. Mas o que você vai ler aqui são revelações que focam a figura do
pai.
Um deles vem do outro lado do mundo. A pediatra Melissa Wake, do Royal
Children’s Hospital, em Melbourne, na Austrália, acaba de realizar uma
pesquisa com quase 5 mil crianças entre 4 e 5 anos. Ela descobriu que a
incidência de sobrepeso e obesidade na garotada em idade pré-escolar tem
relação direta com a negligência dos papais.
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Por que isso acontece? Ninguém sabe ainda. “Aguardamos novas investigações para chegar a conclusões definitivas”, diz a especialista. “Mas a mensagem principal é que não devemos culpar só as mães pelos quilos a mais dos filhos”, afirma. Ou seja, mesmo que elas sejam as responsáveis pela alimentação da garotada, como acontece em muitas famílias.
O papel da figura paterna no desenvolvimento infantil
Médicos e psicólogos dedicados ao estudo da psicossomática — área que
tenta desvendar a interação entre a saúde psíquica e os problemas
físicos — acreditam que os resultados da pesquisa australiana são uma
prova contundente de que a figura paterna é importantíssima no
desenvolvimento infantil.
“A imagem do pai é aquela de quem costuma impor limites aos filhos.
Então, faz sentido a idéia de que sua ausência esteja relacionada a
transtornos alimentares, por exemplo”, opina a psicóloga Maria Rosa
Spinelli, da Associação Brasileira de Medicina Psicossomática (ABMP).
“Décadas atrás, a participação do casal no dia-a-dia das crianças, e
não só a do pai, era muito maior”, ressalva a psicóloga Solange Lopes de
Souza, também da ABMP. Hoje em dia o tempo livre é dedicado mais para
atividades de lazer em benefício próprio. “E o tempo é um fator que
conta muito na qualidade da convivência”, assegura Solange.
Além de problemas como a obesidade, o afastamento do pai — definitivo
ou não — pode ter outras conseqüências no desenvolvimento infantil.
Existem evidências recentes de um elo entre a ausência da figura paterna
e a aceleração do amadurecimento sexual nas meninas.
O psicólogo Bruce Ellis, da Universidade do Arizona, nos Estados
Unidos, mostra que a consolidação das relações familiares ajuda a
retardar a menarca, ou primeira menstruação. Em sua pesquisa, ele
observou 173 garotas desde a idade pré-escolar até a 7a série. Segundo
ele, aquelas que conviviam satisfatoriamente com os pais durante os
cinco primeiros anos de vida entraram na puberdade mais tarde.
A família influencia até na produção dos feromônios
Outro psicólogo americano, Robert Matchock, da Universidade do Estado
da Pensilvânia, acompanhou cerca de 2 mil meninas em idade escolar e
chegou a conclusões semelhantes, mas acrescentou outro dado interessante
às descobertas na área: os feromônios — substâncias que em vários
animais têm a ver com o amadurecimento e o impulso sexual — podem estar
associados com a data em que as meninas entram na puberdade.
E aqui contam não apenas a influência do papai, mas também da mamãe,
dos irmãos e de qualquer outro membro da família. “Uma das hipóteses da
nossa pesquisa é a de que substâncias químicas emitidas por pessoas que
fazem parte desse núcleo podem ter algum vínculo com o amadurecimento
infantil”, explica Matchock. Os dados dessa investigação são relevantes,
mas estão longe de resolver as questões envolvidas no processo de
desenvolvimento de uma criança.
Carinho, atenção, feromônios... Tudo isso pode ter conseqüências na
formação do indivíduo. E, diante das novas configurações familiares, em
que tempo de sobra é artigo de luxo, é preciso estar cada vez mais
atento para as necessidades da criançada.
Por isso, papai, quando o moleque quiser brincar e você estiver lendo o
jornal, pense duas vezes antes de deixar o filhote na mão. Um dia sem
atender aos apelos infantis não vai transformar seu pequeno em um jovem
problemático, nem doente, nem em um obeso. Mas os momentos que vocês
desfrutarem juntos — acredite — vão fazer um bem enorme a ele.
Gravidez precoce é uma forma de compensar o desamparo
A psicóloga Alaide Degani De Cantone, coordenadora do Centro de
Pesquisas e Estudos em Psicologia e Saúde, em São Paulo, observou
meninas que tinham engravidado com 15 ou 16 anos e chegou a uma
conclusão preocupante: as adolescentes podem usar a gravidez como forma
de compensar uma família sem a estrutura adequada, que não forneceu a
elas a atenção necessária durante a infância.
“Em geral essas meninas se referem aos pais como figuras ausentes e
fracas”, diz a psicóloga. “Com a gestação a garota buscaria,
inconscientemente, uma resolução para o seu desamparo como filha”,
completa.
O que é um pai ausente? Não, não é aquele que se separou e, por isso,
não vê os filhos todos os dias. “Trata-se da figura paterna que pouco ou
nada contribui para a formação e a educação dos filhos,
independentemente do fato de morar ou não na mesma casa”, esclarece De
Cantone. E como participar do desenvolvimento da molecada? A especialista dá
algumas dicas: “Participe dos momentos importantes, felizes ou não,
procure compreender a criança nos seus momentos mais adversos,
orientando-a e propondo alternativas para a vida”. Nem sempre é fácil,
mas vale muito a pena.
Fonte: http://bebe.abril.com.br/materia/ausencia-do-pai-pode-comprometer-saude-da-crianca
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