by Márcio Grings
Nesse dia 16 de agosto chegamos a 34 anos da morte do Rei do
rock. Confira dicas de CDs, DVDs e livros que enfocam o ídolo nos anos
70
No início da década de 70, Elvis Presley
(1935-1977) era novamente a bola da vez na música pop mundial. O cantor
havia demarcado seu retorno às apresentações ao vivo de forma triunfal.
O pontapé se dera no lendário 68 Comeback Special, um especial
de final de ano na TV em que o público pôde perceber que o Rei do
rock’n’roll não havia sido deposto do trono. Nesse show, o músico estava
mais uma vez acompanhado da banda original dos anos 50, revisitando com
inteligência grande parte do repertório clássico do início de sua
carreira, e mais: - cantando como nunca após sete anos de ausência dos
palcos. Presley estava decidido encerrar sua medíocre passagem por
Hollywood e tinha planos de voltar a colocar o pé na estrada, em
conseqüentes turnês que o arrastariam de forma avassaladora até o fim de
sua vida.
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Um astro excêntrico
Na verdade, a grande maioria dos resumos biográficos de Elvis Aaron
Presley obstrui algumas verdades e supervalorizam muitas das lendárias
esquisitices. Diversas histórias são mitológicas. Quem mais além dele
fretaria um avião a Denver apenas para comer um sanduíche de geléia e
manteiga de amendoim? Quem mais compraria 14 Cadilacs em apenas um dia,
sendo que um deles foi entregue de presente para uma senhora
desconhecida que apenas olhava a vitrina? Elvis era aficionado por armas
de fogo e gostava de praticar tiro ao alvo nos aparelhos de TV e
interruptores de luz de sua mansão. Tornou-se um hipocondríaco
incorrigível e chegou a tomar mais de 30 tipos de medicamentos durante
um único dia (Amital, Qualude, Dexedrine, Percodan e Dicaudid eram
alguns deles). Entre suas reais doenças, o Rei sofria de glaucoma e de
cólon paralisado devido ao excesso de comidas gordurosas.
Repertório renovado
Se na década de 50, Elvis desafiou com genialidade intuitiva o
“american way of life”, durante os anos 60 ele parecia cooptado pelo
sistema. Entretanto, na década final de sua existência, dá pra dizer que
Elvis era o sistema. Se procurarmos uma data emblemática pós 68 Comeback Special,
esse dia seria 31 de julho de 1969, quando o Rei retornou aos palcos de
Las Vegas, após uma exaustiva sessão de 12 dias de gravações no
American Studios em Memphis. Sob a batuta do produtor, fã e amigo Felton
Jarvis, e do exigente Chips Moman, surgiram dezenas de canções nunca
antes vistas no repertório do cantor.
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Destaque para Suspicious Minds (um de seus principais cavalos de batalha a partir de então). Já em In The Gheto, denotava-se uma rara incursão do Rei pela temática social. Até mesmo Power of Love
parecia uma clara reaproximação com seu passado recente e um evidente
flerte com o rhythm & blues. Dessas gravações, surgiram vários
compactos e, principalmente, um álbum conceitual que devolveria sua
credibilidade artística frente à crítica e público. Era From Elvis In Memphis, um dos grandes consensos da crítica como ponto alto de sua carreira.
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Tempos de soul
O epicentro dessa renovação foi capturado no show-documentário That’s The It Is
(1970), um registro definitivo que apresentava Elvis e sua banda em
todas as nuanças que moveram o turbilhão em sua volta naqueles tempos.
Dos bastidores aos holofotes, vários aspectos foram cuidadosamente
explorados no filme, que se tornou um sucesso absoluto nos cinemas de
todo o mundo. O filme deixou bem claro para o show business que a “marca
Elvis” ainda era um produto confiável e rentável.
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E Elvis parecia incansável, pois nessa época a maratona de gravações
continuava desafiadora. Em apenas cinco dias, gravou mais de 35 canções
com sua nova banda de apoio nos estúdios da RCA. Mais hits surgem desta
safra, entre eles temas definitivos do seu set list, como Stranger in The Crowd, Mary in The Morning, Silvia (um estrondoso sucesso nas paradas brasileiras da época!) e I’ve Lost You.
O tempero negro estava evidente em muitas dessas canções, acentuado
pelo quarteto vocal feminino Sweet Inspirations. Sem falar na banda, que
havia sido escolhida a dedo pelo músico.
O virtuoso James Burton (ex- Ricky Nelson) era o guitarra líder; a
cozinha contava com o baterista Ronnie Tutt (que também passou pela
banda de Gram Parsons) e Jerry Scheff (baixista dos Doors no álbum L.A.
Woman). Completavam o time o guitarrista John Wilkinson e o pianista e
arranjador Glen D. Hardin (que depois comandaria a banda da musa country
Emmylou Harris). E não se esqueçam do quarteto vocal comandado por J.D.
Sumner e uma orquestra sob a regência do maestro Joe Guercio... Ufa! E o
rock’n’roll comia frouxo nos espetáculos. Um exemplo disso é o
formidável e contagiante Elvis as Recorded at Madison Square Garden,
de 1972, retorno triunfal do cantor a New York. O formato do show
básico estava definido: abertura apoteótica a lá Mohamed Ali com o tema
do filme 2001 Uma Odisséia no Espaço.
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See See Rider (ou That’s All Right) iniciava os trabalhos com um pé nos anos 50, mas com a cara dos 70; Proud Mary (o hit do Creedence Clearwater Revival) mostrava que o Rei estava definitivamente sintonizado com o novo rock da época. Never Been To Spain
(sucesso absoluto do Thre Dog Night) denotava que a soul music seguia
circulando cada vez mais forte em suas veias. E aí a coisa seguia,
oscilando baladas e temas mais agitados, até a canção de despedida Can’t
Help Falling in Love. Logo depois a banda e a orquestra tocavam uma
variação instrumental de See See Rider. Os flashes das máquinas
fotográficas o bombardeavam enquanto os guarda-costas Sonny & Red
West o escoltavam são e salvo até um Ford Lincoln. Depois, uma voz
anunciava: “Elvis as left the building, good night!” (Elvis acaba de
deixar o prédio, boa noite!), e no dia seguinte toda a história se
repetiria. Ele e sua banda chegaram a fazer uma média de 130 shows por
ano entre 1972 a 1977. Às vezes, seriam dois no mesmo dia – e dá-lhe
boleta pra segurar a onda!
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O início do fim
Aloha From Hawai foi visto via satélite na TV por mais de 1
milhão de pessoas em todo o mundo. Nesse show, Elvis ainda estava em
forma, vestido como um autêntico super-herói das histórias em
quadrinhos. Roupa especial (Eagle Jumpsuite branco), anéis, cinturão e
até uma capa! Quando foi eleito um dos setes jovens do ano, no seu
discurso de agradecimento deu uma das mais famosas declarações: “Eu
queria que vocês soubessem que eu fui o herói dos gibis. Assisti a
filmes e eu era o herói do filme. (...) Gostaria de dizer que aprendi
muito cedo na vida que, sem uma canção, o dia nunca terminaria... Sem
uma canção, um homem não tem amigo... Portanto, eu apenas continuo
cantando a minha canção”.
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Entretanto, após o show do Hawai, Elvis pareceu embaçar novamente o
foco artístico e começou a se perder em algumas repetições, tanto em
shows, quanto nos álbuns. Na verdade os problemas de saúde também se
tornam cada vez mais freqüentes. É nessa época que sua “persona” toma
uma forma caricata de rock star, que seria para sempre vinculada ao rol
das imagens definitivas da decadência física (e artística) do arquétipo
do rock star. Ao engordar assustadoramente, a lista de remédios também
aumenta. Ainda que, no final das contas, o rei sempre tenha sido um
homem vaidoso, as coisas já estavam fugindo do seu controle no aspecto
físico e psicológico.
Principalmente quando se divorciou oficialmente de Priscila Beaulieu,
em 11 de outubro de 1973 – nesta época, estava namorando a ex-miss
Tennesse Linda Thompson. Não era fácil ser Elvis Presley 100% do tempo e
ainda manter a fama de bonitão. Mas ele não jogava a tolha, assim como a
maratona de shows não diminuía (sempre com lotações esgotadas!). Mas se
formos traçar um paralelo entre espetáculos de 1974 a 1977, as
variações de repertório são muito pequenas. Ou seja: Elvis praticamente
não renovava seu set. Em fevereiro de 1976, a RCA cobrou do cantor
gravações novas de estúdio, já que seu catálogo passava a ser sustentado
quase exclusivamente por coletâneas e registros ao vivo (havia lançado
nada menos do que sete LPs ao vivo num intervalo de cinco anos!).
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É nessa época que sua gravadora disponibiliza ao artista todo um
suporte técnico para montar um estúdio no porão de sua própria mansão. O
estúdio seria batizado de Jungle Room, e foi nele que surgiram as
canções Blue Eyes Crying in The Rain, Way Down, Moody Blue, For The Heart e Solitaire.
Antes de voltar a cair na estrada em 1977, Elvis deu uma de suas
últimas declarações à imprensa: “Pretendo continuar fazendo shows
enquanto eu puder. Sou grato por toda essa lealdade, mas é assustador. O
que virá depois?”. Em 26 de junho, Elvis Presley sobe pela última vez
aos palcos, em Indianápolis.
O fim da linha
Início da tarde de 16 de agosto de 1977. A namorada do Rei o encontra
no piso do banheiro de Graceland, deitado em posição fetal e com rosto
colado ao chão. Gilger Alden chama a ambulância... Mas já era tarde!
Elvis é declarado morto às 15h30min. Causa da morte: parada cardíaca. Eu
tinha quase sete quando Elvis morreu, mas lembro claramente da comoção
que tomou conta do mundo naquela época. As incessantes reprises de seus
filmes, as músicas tocando no rádio, o Globo Repórter especial,
a última apresentação passando em todos os canais e as revistas e
pôsteres nas bancas. O nome de Elvis Presley continua em voga e a
finitude de sua imagem nos parece muito improvável.
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No início deste século, A Little Less Conversation virou sucesso nas pistas de todo o mundo na versão do DJ holandês JXL e também ajudou a alavancar o filme Onze Homens e Um Segredo. A coletânea Elvis 30 # 1 Hits tornou se um dos discos mais vendidos de todos os tempos em 2002. Falando da atualidade, Suspicious Minds é hit em versão 2011 na novel da rede Globo Insensato Coração.
Existem rostos que pertencem ao domínio público do inconsciente
coletivo da humanidade: Jesus Cristo, Buda, Chê Guevara, Pelé... Elvis
Presley! É provável que nem mesmo o próprio artista soubesse da sua
capacidade de permanecer presente durante tanto tempo em nossas vidas.
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Ouça, leia e veja
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Discografia recomendada dos anos 70:
Elvis On Stage (1970) – Bem-vindos aos anos 70. Sweet Caroline e I Can’t Stop Loving You fazem parte desse disco.
That’s The Way It Is
(1970) – Faixas de estúdio intercaladas com gravações ao vivo. Trilha
sonora do filme Elvis Era Assim (como foi batizado por aqui)
Elvis Country (1971)
– Elvis nas terras do leite e do mel. Segundo grande parte da crítica
americana, trata-se do seu trabalho mais significativo nos anos 70
Elvis Now (1972) – De volta ao topo. Outdoors gigantes com a capa do disco invadiram as ruas de Nova York
Elvis As Recorded Live At Madison Square Garden (1972) – O supra-sumo de Elvis nos palcos. Um dos melhores álbuns ao vivo de todos os tempos, segundo a revista norte-americana Spin
Raised On Rock (1973) –
Ray Charles ou James Brown poderiam ter gravado alguns temas desse LP.
Soul music de primeira que na época foi um fiasco comercial. Hoje o
álbum é reverenciado com um dos melhores álbuns "soul" do artista
CDs não-oficiais disponíveis em alguns sites internacionais:
Elvis Opening Night Jan. 26, 1972 –
O primeiro show em Las Vegas na turnê mais bem-sucedida do Rei. É
dessa época o documentário Elvis On Tour, realizado para registrar o
ápice da Elvismania
Elvis If You Talk In Your Sleep (1974)
– Entediado com a rotina de Vegas, Elvis renova totalmente seu
repertório. Oportunidade única para ouvir ao vivo canções de primeira
grandeza, como Good Time Charlie’s Got The Blues, I’m Leaving e a
faixa-título
The Jungle Room Sessions (1976) – As últimas gravações do Rei nos porões de sua mansão em Memphis
Literatura recomendada sobre os últimos dias de Elvis:
Elvis Presley – Vamos dar Uma Festa, de Ayrton Mugnaini Jr (Ed. Biblioteca Musical). Todos os podres do Rei sem enfeites ou rodeios
Elvis Presley e a Revolução do Rock, de Sebastian Danchin (Editora Agir) Relatos
da infância miserável, da revolução causada nos anos 50 (quando Elvis
detonou a explosão mundial do rock'n'roll), da involução dos anos 60
(com filmes e músicas de baixa qualidade) e da agonia existencial dos
70, década que culmina com um Elvis inchado e morto no banheiro porque
seu coração não suportou as doses de pílulas diárias e a consciência de
que o Rei do Rock havia perdido a coroa ao se transformar numa paródia
de si mesmo.
Elvis & Eu,
de Priscilla Beaulieu e Sandra Harmon (Editora Rocco) – Apesar de estar
separada de Elvis quando ele morreu, Priscilla é considerada a
viúva oficial do astro, e por isso tem propriedade para relatar seus
dias de reinado e sofrimento ao lado do ex-marido. Alguns bons momentos e
outros sofríveis, entretanto, o cotidiano e as angústias do artista são
compartilhadas com os leitores sob o ponto de vista de Priscilla.
Elvis, de Odair Jr (Ed. Abril) – Um belo resumo dos fatos
Elvis Presley – A Vida na música,
de Ernst Jorgenses (Editora Larousse) – tudo sobre a obra do cantor e
aquilo que rolava durante as gravações. Sem fofocas sobre sua vida
particular, eis também o mais completo relato sobre o dilema artístico
do cantor na década de 70
Filmografia Indicada:
That’s The Way It Is (1970) – Documentário musical que foi sucesso nos cinemas de todo mundo
Elvis On Tour (1972) – Que saudades dos anos 70! O Rei e seus súditos perdidos na Elvislância.
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