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09 agosto 2015

Shane Carruth E Primer | O PARADOXO TEMPORAL

"O Viajante do Tempo, pontuando suas palavras com o dedo magro em riste, explicava-nos o caso, enquanto nós, recostados às nossas poltronas, admirávamos sua maneira apaixonada e engenhosa de desenvolver o que, então, nos parecia mais um de seus paradoxos."

H. G. Wells


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Viagens no tempo povoam o imaginário sci-fi por décadas e também servem de inspiração para diversos roteiristas destilarem suas teorias em aglomerações mágicas de ficção, caos e fantasia. Exemplos são as obras cinematográficas como "Somewhere in Time" de Jeannot Szwarc ou "A Sound of Thunder" de Peter Hyams.
Paradoxos temporais permeiam a literatura de ficção científica desconstruindo a lógica do tempo linear - abraçando o tempo-espaço - rumo ao encontro do absurdo momento do intrínseco encontro com o passado e/ou futuro. Não obstante, clássicos como “The Time Machine” de H. G. Wells, lançado em 1895 e “A Connecticut Yankee in King Arthur's Court” do lendário Mark Twain, lançado em 1889 ou “The End of Eternity” por Isaac Asimov e as obras do espanhol J. J. Benítez demostram o quão longínquo foram os viajantes do tempo na arte.
Mas poucos trabalhos conseguiram – paradoxalmente – serem tão fincados no chão ao ponto de simplesmente não usarem efeitos - e sim se sustentarem da própria construção enigmática para se consolidarem como – ironicamente - obras atemporais como Primer (2004). A obra faz parte deste seletíssimo grupo de filmes harmonicamente completos, perturbadoramente instigantes. Lento, meticuloso e desafiador são os primeiros atributos desta insana composição orquestrada sob a batuta do então jovem Shane Carruth.

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Para o trabalho do americano Shane Carruth, dois engenheiros começam a elaborar um obscuro projeto. Há de ressaltar que Carruth é formado em matemática e também foi engenheiro de softwares. Diálogos confusos, técnicos, intrigantes como um jogo maçante sem vencedor. As respostas não são qualquer tipo de opção dada por Carruth – que também atua neste trabalho. Alguns outros elementos somados – como um jazz dopante minimalista – se espremem nas bordas. A câmera do diretor é uma entidade estática, há cortes - como pálpebras vagarosamente se fechando e rapidamente em suspensão - também há cores úmidas sufocantes e/ou quentes diálogos incipientes.
Uma voz em off nos permuta observações no passado. Como um visualizador de sensações ocorridas. Proporcionalmente ao avanço da película é também sua febre de sentidos. Sua estabilidade é a nossa assim como os desdobramentos também são sentidos. Como curtos-circuitos de dados sendo jogados em proposições bicondicionais em nossas mentes intrépidas.

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Em certo momento os próprios atores – Shane e David Sullivan – mergulham em suas próprias ansiedades em percorrer os espaços do conhecimento, ou seja, desvendar o que estão fazendo. Shane Carruth nos leva por caminhos inebriantes, sem ilusionismos ou jogos virtuais frivolamente difíceis.
Há em Primer a certeza que as leis da física estão sendo respeitadas. Assim como no “Paradoxo da Duplicação Cumulativa” os personagens em algum instante atravessam a tênue linha do tempo. Não há mais certo ou errado, há apenas a realidade múltipla dos fatos.
O desequilíbrio contínuo de cada membro desta partícula presente: Nós, Shane Carruth, sua família, o mundo lá fora. Embriagado: pelo não delírio, não pela utopia científica e sim pela certeza formigante da alteração: Dos sentidos, da cronológica recepção dos dados. De vários eus soltos numa anárquica - sem protagonismo - tensão de forças. Da corrupção humana prevalecendo ao sonho - já decapitado do futuro - debatendo-se nas cordas temporais.

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Primer foi objeto de culto desde seu lançamento. Há gráficos e fãs apaixonados pela internet dispostos a explicar o trabalho. Seu baixíssimo orçamento e sua proposta (des)lineante certamente contribuiu para que fosse alçado na condição de um pequeno clássico do cinema independente americano.
Como um verdadeiro conto repentino, sem oxigênio, sem gravidade. Shane Carruth subverte a lógica das montagens aleatórias de um cinema de apelo rumo ao universo capaz de criar pequenas legiões de adoradores prontos a desmontar suas peças - como uma nebulosa máquina - e filmes - incapazes de ler suas criptografias - no entanto, nascidos da profunda inspiração de suas concepções labirínticas.

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