Como a maioria das mulheres, Cíntia Rogner, 38 anos, passou a infância sonhando com o casamento. Aos 23, conseguiu realizar o desejo, mas a preocupação para que tudo saísse perfeito foi tanta que a empresária se esqueceu de confirmar se o noivo era, de fato, sua cara metade. “A gente tem dessas coisas, de sonhar com o dia do casamento, mas depois vê que isso não importa tanto, pois é apenas um papel”, acredita.
Com a união desfeita, a empresária passou um tempo acreditando que não queria mais assumir compromissos com ninguém, até encontrar, há nove anos, seu novo companheiro, o arquiteto e urbanista André Rodolfo, 36 anos. Sem assinar nenhum papel, os dois foram morar juntos e, segundo Cíntia, a decisão não podia ser mais acertada. “Resolvi fazer tudo diferente. Nada de formalidade. Segui meu coração e deu certo”, conta a empresária, que recentemente assinou um contrato de relacionamento estável com André para facilitar a compra de um imóvel. O arquiteto diz que, para ele, a falta de papel não fez diferença. “O que importa é estar com quem a gente gosta, e eu gosto dela. Somos felizes, saímos, nos divertimos e estamos juntos nos problemas também”, define.
Muitos fatores certamente contribuíram para a felicidade de Cíntia e André ao longo desses anos. Um ponto, no entanto, chamaria mais a atenção da pesquisadora Kelly Musick, da Universidade de Cornell, em Nova York: o fato de eles terem passado um longo período sem ser formalmente casados. Depois de estudar milhares de homens e mulheres solteiros durante seis anos — período em que vários deles se casaram ou foram morar juntos com o parceiro — ela concluiu que casais que apenas coabitam o mesmo lar têm mais bem-estar do que aqueles que formalizaram a união.
A análise, que por suas conclusões, pode gerar muita polêmica, utilizou uma amostra da Pesquisa Nacional de Famílias e Domicílios dos Estados Unidos. Kelly observou 2.737 homens e mulheres, dos quais 896 optaram por uma união formal ou informal ao longo do estudo. “Acompanhamos as pessoas durante o tempo e focamos em o que muda quando solteiros entram no casamento ou na coabitação. Isso nos permitiu verificar se os benefícios trazidos pelo casamento são exclusivos desse tipo de relação ou também surgem com o morar juntos”, explica a norte-americana, em entrevista por e-mail.
Cíntia e André moraram juntos durante anos até assinarem um contrato de união estável: "O que importa é estar com quem a gente gosta, e eu gosto dela", diz ele |
A
conclusão foi que, apesar de o casamento ser associado a benefícios por
aqueles que estão entrando em uma relação desse tipo, efeitos como
bem-estar psicológico, melhor saúde e uma evolução nos laços sociais
podem ser observados tanto nas uniões formais quanto informais. No
entanto, os benefícios podem vir em doses diferentes. Por exemplo,
homens e mulheres que se casam apresentaram maiores ganhos de saúde em
relação aos coabitantes — muitas vezes, isso está relacionado à
possibilidade de dividirem um plano de saúde melhor. No entanto, as
pessoas que apenas se juntaram tiveram maior ganho de autoestima. “De
maneira geral, a coabitação pode vir com menos obrigações indesejadas e
permite mais flexibilidade, autonomia e crescimento pessoal”, aponta a
pesquisadora.
Burocracia
Algumas vezes, uma união formal ainda apresenta certas vantagens burocráticas, como a apontada pela pesquisadora norte-americana em relação ao plano de saúde. Com isso, muitos casais que decidem morar juntos acabam optando por uma união formal depois de algum tempo, como fizeram Cíntia e André.
Foi o caso também de Mariana Mourão, 33 anos, e Gustavo Reis, 32. Depois de namorarem por três anos, os dois decidiram morar juntos sem se casar. Passados alguns meses, no entanto, viram vantagens em formalizar a relação. “A gente namorava e cada um tinha sua casa. E isso foi ficando caro, pois eram dois aluguéis, duas contas de luz e assim em diante. Aí, ele queria me colocar no plano de saúde dele, nós encontramos uma linha de crédito que era mais vantajosa para o casal e então formalizamos”, lembra Mariana. Da união nasceu Alice, 4 anos, e Bernardo, 4 meses. “Nós somos felizes. O papel não influi em nada, nem para o bem nem para o mal”, opina ela.
Para a psicóloga de Brasília Ivalda Morais, cabe ao casal definir a maneira como viverá — se formalmente ou não. Para ela, pode existir bem-estar em qualquer um dos modelos: “Pela minha experiência, a formalidade (do relacionamento) é indiferente quando o assunto é a felicidade”, relata.
Em alguns casos, cabe ao casal buscar adaptar a relação aos desafios que surgem. O relacionamento de Juliana Machado, 31 anos, e Felipe Araújo, 29, parece ter andado de trás para frente. E para melhor. Os dois namoraram durante um tempo e já pensavam em se casar quando ela engravidou de Antônio, 4 anos. Com o nascimento do filho, os dois se tornaram marido e mulher e foram morar juntos, mas os problemas rotineiros fizeram com que eles se separassem.
Passado pouco mais de um ano e meio, eles reataram o relacionamento, porém dessa vez em casas diferentes. “Quando a gente estava casado, tínhamos sempre que buscar novidades, para não cair na rotina. Cada um na sua casa faz com que a gente tenha a nossa individualidade, sinta mais saudade e isso é um ponto positivo”, explica Juliana.
Felipe acha que o melhor do novo modelo é que os dois realmente só se importam com os problemas reais, sem gerar tantas expectativas sobre o outro. “Antes, o simples fato de um não esperar o outro para jantar podia gerar uma briga. Agora, com a distância, a saudade aumenta e não perdemos tempo com qualquer bobagem”, percebe. O jeito despojado do casal, no entanto, é deixado de lado quando o assunto é a educação do filho. “Nós temos comum acordo nisso. Embora ele tenha duas casas, as regras são as mesmas, independentemente de onde ele esteja”, conta Juliana.
A experiência dos dois reforça a ideia de que dificilmente existe uma fórmula certa para garantir a felicidade. A pesquisadora Kelly Musick ressalta que, apesar de a coabitação aparentemente trazer mais autoestima aos casais, isso não significa que não existem grandes desafios a serem enfrentados nesse tipo de relacionamento. “Nós observamos que, tanto nos casamentos quanto nas uniões informais, o ganho de bem-estar que surge no início tende a diminuir com o progresso da relação”, afirma.
Felipe e Juliana, com o filho, Antônio: casas separadas, mais saudade e menos brigas http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2012/01/31/interna_ciencia_saude,288280/pesquisa-indica-que-morar-junto-traz-mais-bem-estar-que-o-casamento.shtml |
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