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14 julho 2012

A criatividade como provocação Siga os conselhos de Edward de Bono, como ouvir sugestões de funcionários, e veja como desenvolver um pensamento inovador em sua organização e utilizar a provocação para gerar novas idéias.


Enquanto continuam pensando que a criatividade é um dom pessoal, as empresas ignoram milhares de idéias que existem na cabeça de seus funcionários. Este é um dos "leit motiv" de Edward de Bono, o criador do pensamento lateral. Durante o seminário organizado pela HSM em Buenos Aires, o especialista deu algumas pistas para o futuro das corporações.

"Os três elementos-chave no futuro serão a criatividade, a competência e o capital", prognosticou. A eficiência e a solução de problemas não mais serão suficientes, na opinião do especialista, porque a linha econômica de base já não se mantém em constante crescimento, inclusive podendo diminuir; e cada vez existem mais pessoas que geram bens.

Muitas organizações operam sobre a base da manutenção e a solução de problemas. Incluir a criatividade nos negócios é uma tarefa mais complexa. Geralmente, se continua fazendo o mesmo de antes; e, ocasionalmente, a continuidade se interrompe por fusões, aquisições ou a cópia de idéias de terceiros. Hoje, criatividade, estratégia e conceitos fazem falta.

A criatividade no poder

Um tipo de criatividade é a que utilizamos quando sabemos "aonde vamos", mas queremos encontrar uma melhor forma de cumprir este objetivo: menos custos de um modo mais eficiente. Em resumo, procura-se melhorar. "No mundo ocidental, se considera melhoria a solução de problemas. Os japoneses, por exemplo, não só corrigem as coisas que estão erradas, mas também consideram aquelas que estão corretas para melhorá-las", explicou De Bono. Um exemplo desta prática é o da empresa Shell, em 1971, quando decidiu procurar uma forma diferente de extrair petróleo, mesmo que já o fizessem de uma forma eficiente. Assim, conseguiram triplicar o volume das extrações.

Também é necessária a criatividade ao analisar as informações. Às vezes, acreditamos que as informações "vão pensar por nós", mas não é assim. "Pensar é passar de uma configuração das informações para outra. No futuro, será essencial combinar a informação para gerar valor. Não é verdade que da simples análise das informações se obtenham idéias. O cérebro só pode ver o que está preparado para ver; por isso, é necessário que a idéia tenha sido gerada antes na mente. A informação sem a inclusão de possibilidades não gera idéias. A informação sem idéias é fraca", explicou o professor.

No mundo dos negócios, três elementos estão se transformando em commodities: competência, informação e tecnologia de ponta. A diferença - assinalou - está em como tomamos estes elementos para transformá-los em valor. Além de um certo ponto, a tecnologia não gera valor. A tecnologia pode transmitir conceitos de valor, mas não é, por si mesma, um valor. As empresas classificadas como "ponto.com" que vão a falência não fracassam por falta de tecnologia, mas porque a idéia comercial não era boa.

Uma dos motivos pelos quais a criatividade é necessária é que o mundo muda constantemente e apresenta novos desafios e ameaças. A criatividade pode ser empregada também para gerar um uso superior dos ativos.

A solução de problemas é outra das tarefas da criatividade
  • O método tradicional, neste caso, é a análise: averiguar a causa e solucionar o problema. Não se soluciona com mais análise, mas, em muitos casos, também faz falta o projeto.
  • A imaginação criativa pode nos ajudar a prever o futuro, indicando possibilidades.
  • Uma extrapolação em linha reta do passado a respeito do futuro não é suficiente. "A criatividade também é uma necessidade matemática. Qualquer sistema com um aporte de informação ao longo do tempo não será adequado".
  • Sem que exista o conhecimento completo do futuro, não existe forma de retroceder e corrigir", disse De Bono.
O mito do bom pensador

É um mito acreditar que, se você é inteligente, será um bom pensador. A relação entre inteligência e pensamento é potencial, como a existente entre a potência de um carro e a habilidade do motorista. Por si só, a inteligência não implica capacidade de raciocínio.

Muitas pessoas são pegas na armadilha da inteligência: ficam presas nas idéias pobres porque não podem defendê-las corretamente ou utilizam sua inteligência só para comprovar que os demais estão equivocados.

"Apesar de todo o investimento que se realiza na indústria de softwares para PCs, não se fez nenhum esforço para desenvolver softwares para a mente humana. Utilizamos o mesmo de 2.400 anos atrás", afirmou De Bono.

O pensamento do Renascimento permitiu à humanidade usar a lógica e a razão. Foi muito bem aceito pelos humanistas. Este passou a ser o software padrão na sociedade ocidental.
  • O grupo dos três, Sócrates, Platão e Aristóteles, foi responsável por nosso atual pensamento.
  • Outro pensamento que se transformou no software básico do pensamento ocidental está relacionado com a identificação de situações padrão; e quando as identificamos, sabemos o que fazer com uma resposta programada. De acordo com De Bono, esta é a base de 100% de nossa educação e 90% de nosso comportamento.
  • "Por outro lado, o pensamento criativo se ocupa do que pode ser, não do que é. Realmente, somos muito ruins nisto", reconheceu o afamado especialista.
Nosso tradicional hábito de discussão é ineficiente. Geralmente, uma parte pensa que ganhou da outra; o assunto não é explorado. O desenvolvimento do pensamento lateral realizado por De Bono ajuda a sair deste tipo de discussão. Trata-se de que todas as partes se focalizem em algum momento na mesma direção. Utilizam-se as metáforas e os símbolos.

Os seis chapéus

Na sua análise do pensamento, De Bono utiliza o conceito dos chapéus de distintas cores. Cada um destes representa uma das fases da inteligência.
  • O branco representa a informação: aquela a que temos acesso e aquela a que não, perguntas que queremos fazer.
  • O vermelho representa o fogo, sentimentos, intuição e emoções. Nos dá permissão para expressar sentimentos, emoções e intuições sem ter que justificá-los.
  • O preto é como a toga do juiz. Está relacionado com a cautela, a avaliação de risco e crítica. É o mais utilizado. O cérebro está muito acostumado a detectar a não correspondência. É excelente o preto, porém corremos o risco de usá-lo em excesso.
  • O chapéu amarelo é associado ao sol: otimismo, valores, como fazer que as coisas aconteçam. Não é natural para o cérebro. Temos dificuldades para perceber o valor. Sem a noção de valor, a criatividade é uma perda de tempo.
  • O verde é como a vegetação: simboliza o crescimento e a energia. É a criatividade. Todos devem fazer um esforço para serem criativos. Para procurar modificações, possibilidades. Estabelecer hipóteses é fundamental. Na tecnologia, a possibilidade é visão. Na educação, não se dá a atenção devida às hipóteses que são a base da ciência.
  • O azul simboliza o céu: é o controle da organização, dos processos e da supervisão.
"Quando utilizamos os seis chapéus, temos mais poder porque todos utilizam seu pensamento e inteligência na mesma direção e não discutem com os demais. A discussão é um sistema extremamente ineficiente. Com este método, todos olham o objetivo, não consideram o que outra pessoa falou ", afirma De Bono.

Além disso, esta técnica elimina a questão do ego, o problema mais importante relacionado ao pensamento. Com os chapéus, esta trava não existe. Se uma pessoa quer se vangloriar de si mesmo, não o faz ganhando uma discussão, mas o faz conseguindo um melhor desempenho com cada um dos chapéus.

Outro motivo para usar os chapéus é a separação. "Quando pensamos, fazemos tudo ao mesmo tempo. Com os chapéus, fazemos uma coisa por vez: sermos cuidadosos, intuitivos etc. Isso é melhor para otimizar o uso do cérebro, uma vez que o pré-sensibilizamos para cada uma das tarefas. Existe uma razão fisiológica", assegurou De Bono, remetendo aos seus estudos iniciais de medicina.

Dois tipos de usos para os chapéus
  • Uso único: o chapéu se transforma no símbolo de um tipo de pensamento. Utiliza-se em certo momento um chapéu, de acordo com a situação que o requer.
  • Uso seqüencial: estabelece-se uma seqüência de chapéus e se utiliza um por um. É melhor determinar a seqüência de antemão.
    Se bem que a ordem pode ser mudada de acordo com a situação, o consultor fez algumas considerações a respeito. É conveniente começar e terminar com o chapéu azul. Geralmente, é melhor empregar o amarelo antes do preto, ver os valores antes de se lançar à crítica. Depois disso, se emprega o verde para superar as dificuldades. Também é importante empregar o vermelho depois do preto, porque alguma idéia que não é aceitável pode nos agradar igualmente. No final, depois do chapéu azul, pode-se voltar a empregar o vermelho para ver se estamos de acordo com o processo.
Percepções erradas

De Bono também rebateu as percepções erradas acerca da criatividade e assegurou que não se trata de um privilegio de poucos, mas que todos têm a possibilidade de desenvolvê-la.

Algumas das falsas idéias que rebateu o pai do pensamento lateral:
  • A criatividade só tem a ver com a arte; se você um não é artista, não pode ser criativo. Porém, De Bono assegura que a arte é só uma parte da criatividade.
  • A criatividade é um talento que só alguns poucos têm. "Se não fazemos nada a respeito da criatividade, dependerá só do talento natural. Geralmente, diz-se que se você está inibido não pode ser criativo. Não é assim, estando desinibido também não consegue. É preciso se capacitar para aumentar o potencial", explicou o especialista.
Por muito tempo - assinalou De Bono -, tratou-se de compreender a criatividade em um universo de informação equivocado. Criatividade e informação funcionam em dois universos separados. O cérebro deve ser estimulado, sua excelência está em poder organizar as informações recebidas em padrões de rotina.

"O humor é uma das atividades mais significativas do cérebro. Quando se trata de criatividade, vamos pelo caminho principal e, de alguma forma, nos movemos para o caminho lateral", explicou o especialista em inovação durante o seminário.

De acordo com o guru, cada idéia criativa sempre é lógica quando se olha retrospectivamente. A menos que compreendamos os sistemas de padrões assimétricos, não entenderemos a criatividade, já que ela consiste em organizar a informação neste tipo de padrões.

Como desenvolver o pensamento lateral

Os processos para por em prática a criatividade foram abordados generosamente por De Bono, que inclusive realizou exercícios com os participantes do seminário. Entre as distintas técnicas para se chegar ao pensamento lateral, o especialista mencionou o desafio, as alternativas e a provocação, o mais poderoso dos mecanismos que, por sua vez, é o mais distanciado do pensamento padrão.

1) DESAFIO

O desafio implica no abandono do enfoque usual, do modo habitual de se fazer as coisas. É uma atitude mental, uma disposição a questionar as coisas. A questão implícita é: Existe outra forma de se fazer as coisas?. Questiona-se através do "por que" a singularidade de um produto, por exemplo, as razões de suas características e se existe outras formas alternativas de fazê-las.

Um caso que serviu a De Bono para exemplificar esta técnica foi o de uma taça de vinho. Primeiro, ele questionou a necessidade de haver uma borda para se tomar o vinho. A resposta foi que sim, era necessário; mas não totalmente. Logo, ele perguntou as razões pelas quais a borda da taça devia ser redonda. Tendo em conta as técnicas de fabricação de taças através do vidro soprado, utilizado tradicionalmente, concluiu que ali estava a causa. Porém, hoje pode se fazer uma taça só com uma parte da beirada. Desta forma se evitaria que nas taças altas o nariz toque a borda. "Trata-se de criar valor, não de resolver problemas", resumiu.

O especialista assegurou que existe uma lista de itens rígidos que ainda falta questionar:
  • A idéia dominante, as fronteiras (sempre utilizamos fronteiras ao pensar, assegurou), as suposições ("Não se pode pensar sem elas, o pensamento é uma suposição que se apóia em outra e em outra. Mas podemos ser conscientes delas e desafiá-las", disse), os fatores essenciais e as tendências polarizantes.
  • Apesar da ênfase nos questionamentos, De Bono reconheceu que, na prática, é difícil realizar esta tarefa, porque só prestamos atenção aos problemas.
2) ALTERNATIVAS

Esta técnica determina que por trás de toda alternativa, existe um conceito. O conceito brinda a flexibilidade, é uma parte-chave do pensamento. Este enfoque do pensamento lateral é como um efeito cascata. "Temos um objetivo, direções possíveis para abordá-lo; conceitos para cada direção e idéias para cada conceito. O aspecto específico é a idéia, o conceito é a raiz, e a direção é o caminho. Mas isso é considerado de trás para a frente: direção, conceito, idéias", explicou o guru. Um caso que ele explicou ao público foi o da falta de pessoal qualificado. Uma possível direção seria incrementar a produtividade do pessoal que temos, através da melhor utilização do tempo, fazendo com que se esforcem mais (concretamente, com horas extras ou incentivos). Outra direção possível é a de reduzir a necessidade de gente qualificada. Outras alternativas podem ser avaliadas.

3) PROVOCAÇÃO
É a forma mais poderosa do pensamento lateral. Significa colocar uma idéia intermediária distinta das demais. O pensamento sai do caminho tradicional para encontrar distintas alternativas, a fim de chegar a destino. Logo, visto em retrospectiva, o caminho alternativo resulta em ser completamente lógico. A técnica implica em passar de uma posição estável através de uma instável para outra estável. Às vezes, para chegar a uma posição, é melhor se locomover primeiro para outra, para chegar, então, a partir desta posição. "A provocação nos permite ser loucos, mas de uma forma controlada", acrescentou.

Existem duas etapas: preparar a provocação e utilizá-la. Para este segundo passo, trabalha-se com o movimento. "O movimento é um processo diferente da razão. Na razão, quando chegamos a uma idéia, se esta não é correta, a descartamos. A razão se ocupa do que é ou não é. Porém, o movimento se ocupa de aonde nos levam as coisas. Chegamos a uma idéia e, caso ela não seja correta, igualmente vemos aonde ela conduz e seguimos em frente", esclareceu o especialista.

Distintas formas de lograr o movimento:
  • Encontrar o conceito, princípio ou característica. Toma-se um conceito e se constrói uma idéia em torno dele.
  • Concentrar-se na diferença. Neste sentido, De Bono comentou que uma das frases "assassinas" das boas idéias seria: "É o mesmo que...". É uma armadilha, tendo em vista que, em última instância, caso se passe a um nível suficientemente amplo, todas as coisas são iguais.
  • Instante a instante. Ver a provocação em ação.
  • Ver os aspectos positivos. É quase como usar um chapéu amarelo. Utilizar aspecto o positivo e agregar valor.
  • Circunstâncias especiais. Significa detectar se, para uma provocação, existe uma circunstância particular que possa gerar mais valor.
    "Podemos ter uma idéia não muito interessante e depois considerar um conceito a partir do qual possamos encontrar uma idéia que tenha valor. O movimento é a disposição de nos movermos para frente", explica De Bono.
Fontes de provocação

A provocação pode nascer de duas origens diferentes:

- Surgimento: Surge de forma espontânea. Não procura deliberadamente ser uma provocação, mas é tratada como se fosse.

- Deliberada: É uma forma sistemática e formal de demonstrar provocações.

Neste último grupo existem varias técnicas:
  1. A fuga: Detecta-se algum aspecto que se dá por concluído, e depois é cancelado. Por exemplo: uma provocação pode ser pensar em um restaurante sem comida. A partir disso, se procura uma alternativa que gere uma nova idéia: por exemplo, um espaço onde as pessoas recebam um serviço completo de atendimento e utensílios necessários etc., e onde as pessoas levem sua comida, como se fosse em um piquenique.
  2. Investimento: Outra das formas de conseguir a provocação consiste em raciocinar da forma oposta à lógica. Um tema poderia ser em vez de pensar como diminuir determinados componentes do cigarro (tabaco, alcatrão), tratar de imaginar como acrescentar, por exemplo, ar.
  3. Exagerar: Tomar o nível habitual da medida e exagerar para mais ou para menos. Nas Olimpíadas de Los Angeles, conseguiu-se um grande impacto graças a esta técnica . Em vez de utilizar uma única tocha, como é habitual, utilizaram-se mil tochas.
  4. Distorção: Mudança na relação. Em vez de ABC, ACB.
  5. Desejo: São coisas que imaginamos. É menos automática que as outras.
"O movimento é o mesmo, não importa qual seja a fonte da provocação", explicou o consultor, para quem o pensamento lateral é uma ferramenta formal indispensável para se gerar, de forma deliberada, novas idéias. Na história, idéias poderosas muitas vezes foram desencadeadas por acontecimentos aparentemente aleatórios.

"Como fazemos para ter um ponto de partida sem escolhê-lo? Uma forma é procurar uma palavra ao acaso e evitar assim os mecanismos de rotina do cérebro. A preferência de padrões a partir da periferia é diferente da que temos a partir do centro. É assim como funciona a expressão "ao acaso".

Indo a partir da periferia, em um sistema de padrões, chegamos a caminhos distintos dos que podemos atingir a partir do centro", explicou De Bono.

Muitas pessoas acreditam que a criatividade é somente um brainstorming. "Também se pensa que é somente uma tarefa realizada em grupo. Porém, ele pode ser utilizado por uma só pessoa. Na Universidade de Wisconsin, foi comprovado que as pessoas criativas produzem mais sozinhas", assegurou o especialista, para quem, nas organizações, a criatividade se resume em uma expectativa ou um risco.

Apesar da grande ênfase que é atribuída hoje à criatividade dentro das empresas, já não se duvida de que seja uma vantagem competitiva; o guru reconheceu que, em muitos casos, levar estas técnicas na prática não é fácil. "Estar a favor da criatividade não é suficiente. A tarefa de todos é tarefa de ninguém. Por isso, acredito que é importante que se nomeie um Campeão do processo, uma pessoa que, sem ser a mais criativa ou brilhante, atue como nexo das boas idéias dentro da organização", recomendou o especialista.

Deve ser alguém que tenha muita energia e boas relações dentro da empresa e que se possa dedicar a reunir idéias e difundi-las dentro da organização. A pessoa criativa está demasiadamente concentrada em gerar as idéias, assim como em se ocupar desta missão, que também é vital.

A criatividade no tempo

De acordo com o especialista, existem dois tipos de criatividade.
  • A Cotidiana se refere à disposição natural para procurar alternativas e questionar as coisas.
  • A Específica, por outro lado, implica um desejo explícito de criar. "Trata-se de dizer neste momento que estou sendo criativo", explicou o especialista. Nesse caso, existem dois tipos de enfoque. Pode-se enfocar o propósito ou finalidade: ou seja, um objetivo direto para resolver um problema. Também se pode enfocar a área. Não existe uma finalidade específica, define-se a área na qual se deseja gerar idéias. Sem nos focalizarmos nas áreas, geralmente tendemos a pensar somente nos problemas. "Com este outro enfoque, podemos pensar em qualquer coisa. Ele é mais amplo. O enfoque na finalidade sempre fica dentro do pensamento existente", aclarou De Bono.
"É difícil propor idéias sem pensar nos problemas. As necessidades criativas não existem até que as fazemos existir. As organizações devem ter uma lista de necessidades criativas. Não mais de um terço dela devem se constituir de problemas. É uma forma prática de incorporar a criatividade na organização", comentou.


Estefanía Giganti e Paula Boente
Veja a seguir as perguntas e respostas feitas ao guru durante o seminário na Argentina:
  • Já que existem diferenças culturais a respeito da geração de novas idéias, como trabalham os argentinos neste sentido?

    Não fiquei tempo suficiente no país para responder com maior precisão à pergunta. Porém, suspeito que os argentinos têm um elemento em comum com os italianos: a necessidade de que suas idéias obtenham a aprovação de seus amigos.

  • Se você fosse o responsável pela área de Recursos Humanos de uma organização, que medidas tomaria?

    A função de Recursos Humanos está relacionada com dois aspectos: dirigir pessoas e suas carreiras e desenvolver indivíduos. Neste sentido, a primeira medida seria ensinar os trabalhadores a pensar. Este é um recurso muito pouco utilizado; se não aproveitássemos o capital na mesma forma, seríamos despedidos. Na África do Sul, um de meus assistentes trabalhou com mineiros analfabetos, ensinando-os a pensar. O número de brigas entre eles diminuiu de 21 para 4 e sua produtividade aumentou. Algumas mudanças podem gerar imensos benefícios. Fazer esforços para melhorar o pensamento individual.

  • Que fatores na organização impedem o desenvolvimento da criatividade?

    A criatividade não acontecerá, a não ser que ela represente uma expectativa da alta gerência. Existe, ademais, uma falha na linguagem. Quando uma pessoa põe uma idéia em prática e ela não funciona como se esperava, diz-se que houve um erro; mas muitas vezes não é assim. Existem empreendimentos que, mesmo que não tenham êxito, estão plenamente justificados. É necessário premiar este esforço. Outra das travas é a complacência: "se os resultados foram bons até agora, por que teríamos de trocar a forma pela qual fazemos as coisas?" A política da simples manutenção e a resolução de problemas gera maior dificuldade para o desenvolvimento da criatividade na empresa.

  • A Economia teve um grande desenvolvimento nos últimos tempos, acredita-se que se produziu uma evolução similar no modo de pensar?

    Provavelmente, sim. Existe um enfoque global nos negócios, e as pessoas também lêem os mesmos livros. Isto não é necessariamente ruim. Apesar do pensamento global, existem diferenças locais. Por exemplo, enquanto na Itália se destacam as PeMEs como motores da Economia; na Alemanha, o fazem as empresas de prestação de serviços médicos de 500 funcionários; e, na Finlândia, são as grandes empresas como a Nokia.

  • Como serão as escolas nos próximos anos?

    Entre 1900 e 2000, um dos aspectos que menos mudou foi a Educação. As escolas deveriam ensinar a pensar. A qualidade do futuro depende da qualidade do pensamento. O pensamento deve ser também construtivo, só pensamento crítico não é suficiente. Trabalhando com jovens, detectei que eles geralmente pensam que basta identificar um inimigo. Dessa forma, não faz falta pensar mais, tudo passa a ser culpa desse inimigo. Isto não leva a nenhum progresso, é uma desculpa para não se pensar mais. O pensamento deveria ser uma matéria central. A esta, devemos acrescentar a operacionalidade, a habilidade de fazer, porque o conhecer não é o bastante. Tem-se demonstrado que os jovens que têm hobbies na escola têm mais sucesso posteriormente em suas vidas. Outro aspecto importante que deve ser ensinado é a criação de valor na sociedade. Muitos jovens conhecem os nomes das esposas de Henrique VIII, mas não sabem como funciona o estabelecimento da esquina. Por último, acrescentaria o comportamento de sistemas, saber como funcionam os sistemas. A educação requer uma revisão profunda. O sistema está paralisado.

  • Como pode uma empresa independente aplicar o pensamento lateral para competir em um mercado monopolizado?

    É muito difícil para uma empresa grande defender todo o seu território. A pequena ou média empresa deve então procurar o nicho, aquilo que pode fazer melhor do que a mega-organização. Por exemplo, se for um fabricante de chá, pode fazer saquinhos menores para aqueles que não querem o chá tão forte. Este produto não seria tão massificado para ser vendido pela empresa de grande porte.

  • A criatividade é aplicável a todas as áreas? Como pode ser aplicada naquelas áreas que são pouco flexíveis?

    Alguns aspectos devem ser rotinas em uma organização. O resto, aquilo que não é completamente rotina, implica na criatividade. Naquelas áreas que correspondem ao primeiro caso, é possível aplicar a criatividade para verificar que as práticas utilizadas são as melhores.

  • Quando o tempo é escasso, como é possível aplicar a criatividade?

    O pensamento não requer muito tempo. Existem dois tipos de pensamento: o urgente, que permite resolver os problemas imediatos, e o importante. O urgente muitas vezes se expande e tende a ocupar todo o tempo disponível, deixando de lado o importante. Nas empresas, espera-se que as pessoas estejam constantemente ocupadas. Devemos estruturar nosso pensamento e nossa atividade de forma a deixar algum tempo ao pensamento importante, que pode ser somente 5% (cinco por cento).

  • De onde deve partir a criatividade, necessariamente da alta gerência?

    A diretória e a alta gerência fixam a cultura e a estrutura, e devem determinar que a criatividade é importante e que será reconhecida; então, todos trabalharão nas idéias. O reconhecimento é fundamental.

  • Os funcionários criativos podem desestabilizar o organograma da empresa? Podem ser vistos como uma ameaça?

    O sentido da criatividade é gerar idéias. Uma vez que se têm as idéias, utiliza-se a razão para decidir qual utilizar, qual é mais valiosa para a organização e quais são os riscos e os ganhos possíveis, no caso de utilizá-las. O perigo de produzir desestabilidade por causa da criatividade não é real, uma vez que a razão é a que decide em última instância.

  • Qual é o ambiente propício para a criatividade? Como se consegue que seja um recurso constante na organização?

    A criatividade é um hábito mental. O aspecto-chave do ambiente no trabalho para incentivá-la é a expectativa de criatividade. A isto deve ser acrescentada a possibilidade de debater idéias e o fato de saber a quem recorrer para apresentá-las.

  • Como pode ser aplicado o pensamento lateral na venda de produtos de massa?

    Muitas vezes, foi utilizada a técnica dos seis chapéus para a inter-relação entre os vendedores e os clientes. Ele oferece um marco favorável para a interação com as pessoas. O sistema oferece um valor a mais aos vendedores, tendo em vista que ao dispor de uma estrutura para a interação com o cliente, seu discurso será mais efetivo.

  • O que o senhor recomendaria para se vencer o medo de ser criativo?

    Os temores habituais são dois. Em primeiro lugar, o de se propor a ser criativo e não obter resultados. Neste caso, é preciso recordar que a atitude em sim já é importante, e que cedo ou tarde a pessoa terá seus frutos. Um segundo temor é que a idéia proposta não agrade aos demais, o que não significa que seja uma má idéia. A criatividade tem a ver com a confiança. Podemos ter pequenas idéias, mas que sejam criativas. É importante provar se dá resultado. Um experimento com estudantes demonstrou o papel fundamental da confiança. Foram Recrutados três grupos de jovens. Ao primeiro grupo foi dada uma bebida alcoólica, mas sem que eles soubessem; ao segundo, foi dito que eles tinham bebido algo alcoólico, mas isso não foi verdade; e ao terceiro, não foi dado nada, e também não foi explicado coisa alguma. Em seguida, foi solicitado que eles tentassem ter idéias criativas. Aqueles que pensavam que tinham tomado bebida alcoólica foram os que tiveram os melhores resultados. Tenho pensado em fabricar o "Elixir De Bono": será um vidrinho que contém apenas suco de espinafre, porém com certeza animará às pessoas a serem criativas.

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