O riso que vem da calamidade humana
Por Ricardo Flaitt
Na
comédia de humor negro “Feios, Sujos e Malvados” o diretor Ettore Scola
mostra o ser humano em sua condição de barbárie, à margem do sistema,
dos princípios, dos padrões determinados pela sociedade. E, desta forma,
mostra até os tempos atuais, os seres humanos que estão diante de nós
no dia a dia, nos aglomerados urbanos ou sob os viadutos da cidade.
O
filme de Scola se passa na Itália, mas pode ser qualquer periferia do
mundo. Numa favela aos arredores de Roma, Giacinto é um ex-operário que
sacrifica um olho para receber uma indenização proveniente de um seguro
e, assim, viver a não fazer nada, a não ser esconder paranoicamente sua
pequena fortuna dos demais membros da família.
Giacinto
(interpretado magistralmente por Nino Manfredi) convive com mais 15
membros, entre mulher, filhos, sua mãe, genros e agregados, que vivem
num barraco de três cômodos. Nesse universo, a família formada por
ladrões, prostitutas, um transexual, vagabundos e crianças interrelacionam-se de
maneira que vai do promíscuo ao escatológico.
É
um mundo que transcorre em meio a animais, sujeira, escatologia,
incesto, evidenciando que o homem longe dos padrões estabelecidos,
obedecendo apenas aos seus instintos mais primitivos.
Nesse
cenário de barbárie humana, a intenção do diretor Ettore Scola é fazer
ressaltar aos olhos o estado de total descaso em que são submetidas as
pessoas que vivem à margem da sociedade.
|
... Ele então encontra uma personagem retirada dos pesadelos de Fellini, de
tão asquerosa que é. E apaixona-se. Não sem antes acasalar com a mesma
em público, debaixo de um cartaz. Com ela ele gasta dinheiro, sai para
jantar, passeia e a beija incessantemente. A família se revolta quando
ele a trás para casa. |
O
riso nos é provocado por meio das situações mais absurdas, situações
limite entre o ser humano e o animal, um riso que nos chega à boca
diante da calamidade, do não convencional, do fora da ordem do que
determina o sistema.
Um
filme que nos faz lembrar do nosso lado animal, de nossas ambições
tacanhas, nos faz dar risada diante de nossa condição humana e frágil,
que se desmancha no ar das aparências.
FEIOS, SUJOS & MALVADOS
(Brutti, Sporchi e Cattivi , Itália, 1976). Direção: Ettore Scola.
Roteiro: Sergio Citti, Ruggero Maccari, Ettore Scola. Elenco: Nino
Manfredi (Giacinto Mazzatella), Maria Luisa Santella (Iside), Francesco
Anniballi (Domizio), Maria Bosco (Gaetana), Giselda Castrini (Lisetta),
Alfredo D'Ippolito (Plinio), Giancarlo Fanelli (Paride), Marina Fasoli
(Maria Libera), Ettore Garofolo (Camillo), Marco Marsili (Vittoriano),
Franco Merli (Fernando), Linda Moretti (Matilde), Luciano Pagliuca
(Romolo), Giuseppe Paravati (Tato).
Ricardo Flaitt é jornalista e estudante de História.
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