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06 agosto 2013

O BANHO NOSSO DE CADA DIA

O banho funciona como o primeiro sim que você dá a vida

 Por Hilda Lucas

Banho de vira-lata é aquele em que você entra de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo o que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais freqüente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas, com usa impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranhamente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
Por isso quando vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha…) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
(…)
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
(…)
No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega.No banho, nosso dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos nossos segredos, nossos mergulhos.No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho…”. Banho é refúgio, é reset.
(…) Mas tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida.
Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de outro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e do reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.

Publicado originalmente na Revista Lola Fev/13
A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
- See more at: http://vigisantissima.com.br/o-banho-nosso-de-cada-dia/#sthash.MclaOCs3.dpuf
A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
- See more at: http://vigisantissima.com.br/o-banho-nosso-de-cada-dia/#sthash.MclaOCs3.dpuf
A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem. É no comezinho que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro. Enquanto você dá conta dessa teimosia, está rolando os dados.
Por Hilda  Lucas
banho
   ” Foi horrível, a gente brigou feio, se machucou, se ofendeu, ele saiu batendo a porta e, depois de ficar ali parada sem saber se ia atrás ou pulava da janela, sabe o que eu fiz? Entrei no banho. Tomei um banho de vira-lata e saí gente de novo. “
    Banho de vira-lata é aquele em que você entra quase de quatro, se arrastando, se sentindo destruída. Você chora alto, senta no chão, cogita se afogar. Você liga o chuveiro e tudo que você quer é se diluir, esvaziar. Você gasta sua cota anual de água, conta todos os azulejos, sai com os olhos inchados, pele de uva passa, mas sai, e esse sair é transformador. Algo sempre muda depois de um banho de vira-lata e o mais frequente é você se dar conta de que aquele banho lhe fez bem. Um bem simples, reconfortante, que pôs você no prumo, lhe devolveu o rumo e lhe deu força para encarar o dia, a barra de viver, as feras todas. O banho de vira-lata é aquele que você toma com “seus botões de carne e osso”, com seus fantasmas,  com sua impotência, seu pânico. Nele você entra sem saídas, sem respostas e pode até sair sem soluções, mas sai estranham ente apaziguada, você sobreviveu ao banho e parte do desespero escoou pelos poros, pelo cano. No banho, a drenagem do cansaço, o conforto da limpeza, a certeza de que a vida segue lá fora, pois banho é reparação.
     Por isso, quando a vida mandar você tomar banho, vá! Vá sem medo, mesmo que se debulhando. Confie no poder do banho. Confie na função terapêutica da rotina. Enquanto você dá conta de se arrumar, se alimentar, trabalhar, dormir (mesmo que com uma ajudinha … ) e tomar banho significa que você está rolando os dados. A gente tem horror à rotina e isso é uma bobagem, pois é no comezinho da rotina que a vida se organiza e as dores cicatrizam. Um dia após o outro, um banho após o outro.
    O banho nesse quesito é emblemático. Tão simplesinho, tão arroz com feijão, tão generoso. Nossa dose diária de esperança e entusiasmo. O banho nosso de cada dia é uma espécie de oração, de teimosia, de pacto. Na maioria dos banhos, apenas cumprimos nossa rotina de asseio e civilidade. Mas banho que é banho é muito mais que higiene.
Quantas vezes bradamos: “Meu Deus, preciso de um banho!”, certos de que o banho nos devolverá equilíbrio e força. Tomamos banho e ficamos novos, limpinhos, recompostos. Um milagre caseiro feito de água e sabão. Uma parada, um respiro, uma trégua.
   “Tudo o que eu pensava era que quando saísse dali tomaria um banho. Um banho demorado, no escuro, com música e vinho. O juiz lia a sentença do divórcio e tudo o que eu pensava era em tomar banho. Como se no banho eu fosse me livrar de todo o massacre daqueles dias, me limpar de todas as nódoas, esvaziar o vazio. “
A vontade de tomar banho aflora como uma urgência, uma tábua de salvação, um remédio nas horas mais difíceis e complexas. Tomar banho depois de uma situação extrema é o primeiro indício de que a vida voltará, de uma forma ou de outra, para os trilhos. O banho funciona como o primeiro sim que você diz à continuação do viver.
   “No primeiro banho que tomei depois que meu marido morreu, entendi que eu não tinha morrido com ele. Parece óbvio. mas eu só entendi no banho, um banho igual a todos os outros e totalmente diferente de todos os outros. Pensei comigo: assim serão meus dias, iguais e totalmente diferentes … “
   No banho, mais que xampus, espuma, cremes, sais, há também o choro, as marcas do amor, as secreções, o medo e a convalescença descendo redentoramente pelo ralo. No banho, a possibilidade de esquecimento, de recomeço, de entrega No banho, nossos dilúvios, nossos redemoinhos, nosso desaguar sem fim; nossos batismos, nossos segredos, nossos mergulhos. No banho, os resíduos do ontem, a troca de pele, o tempo suspenso.
   Saímos de hospitais e enterros pensando em banho; tomamos banho depois de brigas, demissões e discussões. Neutralizamos o desgaste do dia, do trânsito, do trabalho com um banho bem tomado. O banho é, portanto, um hiato entre estágios, interfere no tempo vivido, limpa o corpo, desperta a consciência, nos acorda por dentro. Quantas vezes pensamos no meio da correria da vida: “Daria tudo por um banho … “. Banho é refúgio, é reset.
     Mulher é um bicho cheio de fluidos e fluxos, marés e maremotos. No mundo feminino, banho que é banho tem um quê de nascimento de Vênus, algo mítico, inaugural, pois alguns banhos são fundadores, divisores de águas. São os banhos de estreia. Aquele que a gente toma depois da primeira menstruação, quando cheias de sustos e intuições vemos sangue misturar-se à água. O banho depois da primeira trepada… O corpo novo, doído, doido, desperto banhando-se de outro. Depois, você inventa sexo no banho e o banho vira leito de rio, pororoca. E o banho que você toma quando descobre que está grávida? Todos os banhos durante a gravidez? O corpo expandindo, os seios explodindo, a imaginação voando.
         São os banhos de Eva: você e toda a Criação ali, debaixo do chuveiro, imersas em plenitude. Então, vem o banho da maternidade: o leite escorrendo do peito da mãe recém-nascida e você pensa extasiada que teve um filho e filho é para sempre. Mais tarde você analisará no banho as rugas, a flacidez, as marcas do tempo e, depois de certo assombro, tomará seu banho com a mesma diligência amorosa de sempre. No banho, a crônica da vida
           Mas só quando você toma um banho day after, você compreende a força do banho. Banho day after é aquele do dia seguinte a uma ruptura, uma tragédia pessoal. Você sabe que depois daquilo nada será como antes. A vida não será a mesma, nem você será a mesma e, no entanto, você toma banho como se tudo continuasse como era. É incrível. Sua mãe morreu e você toma banho como fez todos os dias. Você se separou e lá está você no banho, a despeito de tudo. Você perdeu um filho, um irmão, sua melhor amiga ou descobriu que tem um tumor e, estoicamente, toma banho. O santo banho, aquele que faz você voltar a funcionar, pois, no caos, o hábito é a regra de ouro para que a vida se recomponha. Nessas horas, tomar banho é comovente. E você tem certeza de que a vida é pura teimosia, que continua a despeito das perdas e dos reveses e no banho você está apenas afirmando: estou dentro, estou viva.
       “A ardência do xampu no olho me despertou. Já estava no banho há horas. Entrei nele feito um zumbi e fiquei debaixo do chuveiro inerte, querendo descer pelo ralo. Não desci, não me esvaí. O ardido no olho me fez reagir. Terminei meu banho com eficiência. Quando saí, caí num choro diferente daquele que eu tinha chorado antes. Lá estava eu, diante do espelho e do resto da minha vida: nua, em carne viva, viva. Fiquei comovida. Era meu rosto, eu mesma. Havia sobrevivido, haveria de sobreviver. A vida por ser reescrita, um novo futuro para construir, um trabalho de doido que acabara de começar com aquele banho. “
         Banho que é banho lava a alma.
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